
É realmente estarrecedor testemunhar o modo com que certos gestores públicos aprimoram a arte de tentar driblar às leis. O prefeito de Tutóia/MA, senhor VIRIATO CARDOSO, nesse sentido, parece ter descoberto a fórmula perfeita para unir interesses pessoais, compromissos de campanha e, claro, os cofres municipais. Prova disso é a recente Ação Popular – com modestos 27 páginas e um “imodesto” acervo de provas protocolado na data de ontem no Fórum de Tutóia – que se deu ao minucioso trabalho de elencar, com riqueza de detalhes, como o prefeito, num admirável espírito de camaradagem -, teria direcionado cerca de R$ 2,348 milhões em contratos, sem a cansativa formalidade de um processo licitatório convencional. Dentre as supostas benesses, brilha o nome de Dr. Pedro Braide (Pedro Braide Sociedade Individual de Advocacia), cujo histórico de participação na campanha eleitoral do prefeito, certamente o credenciou, como a escolha mais…legítima.
Afinal, R$ 513 mil é apenas um detalhe perto da gratidão que se deve a um profissional tão dedicado nas eleições. Na mesma toada de cortesia, o escritório de contabilidade (CONTABILIZA) que, cuidou das contas eleitorais de 2024, para surpresa de ninguém, recebeu um gentil agrado de R$ 1,2 milhão, reforçando a ideia de que quem cuida bem das contas de campanha também merece cuidar das contas públicas. E como esquecer o generoso presente de R$ 635 mil à empresa HIDRAELE, que, ao que tudo indica, prestou inestimáveis serviços na jornada rumo ao sucesso eleitoral do prefeito? Fica evidente que, em Tutóia, a palavra “compromisso” é levada muito a sério: quem ajudou, recebe a devida retribuição. Não é todo dia que se vê tanta fidelidade política e administrativa. No entanto, a apresentação desta Ação Popular, protocolada na tarde de ontem, lançou uma sombra incômoda sobre esses acordos, pois pleiteia a imediata suspensão ou nulidade dos contratos. Como lidar com essa intromissão inoportuna no que muitos chamariam de “gestão criativa dos recursos públicos”? É de se lamentar que o prefeito VIRIATO possa ter de explicar, com certa urgência, por que resolveu dispensar licitação e se aventurar na adesão a atas de registro de preços que, curiosamente, beneficiaram antigos aliados de campanha. Alguns pessimistas podem dizer que a situação é delicada e que Sua Excelência terá imensa dificuldade de honrar os acertos com quem, supostamente, financiou sua eleição. Mas não nos apressemos em julgamentos: afinal, a capacidade de inovação administrativa pode muito bem surpreender a todos. Talvez existam explicações capazes de encantar qualquer tribunal, quiçá amparadas em princípios ainda desconhecidos do grande público. Enquanto aguardamos os próximos capítulos, resta-nos apenas admirar o quanto certos gestores conseguem, simultaneamente, cultivar laços de amizade e movimentar volumosos montantes do erário sem precisar da maçante concorrência pública.
Esperemos que a Ação Popular não seja muito dura e que, se for, ao menos sirva para lapidar ainda mais esse raro talento de unir interesses particulares e verbas públicas. É preciso, pois, reafirmar que o poder não é um privilégio, mas um encargo voltado ao bem comum. A licitação, ainda que seja um processo minucioso, existe para assegurar isonomia e eficiência nos gastos públicos. Qualquer tentativa de contornar essa premissa fundamental – especialmente de maneira consciente e repetida – deve ser prontamente coibida e punida, em nome da probidade administrativa e do respeito que a sociedade merece. Afinal, transparência, legalidade e competitividade são princípios tão… tradicionais, não é mesmo? Sigamos atentos. Quem sabe o que o futuro reserva para esse modelo exemplar de “colaboração” entre o poder público e seus fiéis escudeiros de campanha? E o futuro é bem ali.
EDITORIAL IMARANHAO